Canuto lembra fase de repórter esportivo com novo Garrincha e japonês babão
Maurício Dehò
Do UOL, em São Paulo
Os 125 kg e 1,94 m de altura já fazem Márcio Canuto ser notado em qualquer lugar. Mas é quando ele solta a voz que se vê a fama que o precede. O tom rouco, a velocidade e, principalmente, os gritos empolgados são as características que fizeram o repórter ser conhecido na TV. E se hoje ele se dedica ao jornalismo comunitário, seu estilo único foi moldado em outra editoria: a de esportes.
Canuto já tinha todo o talento para ousar, brincar e encontrar personagens excêntricos como faz hoje, quando se embrenha nos bairros mais distantes de São Paulo para fazer seu papel de "fiscal do povo", na TV Globo. O talentoso e divertido Jacozinho e o japonês Kazu Miura são os exemplos mais clássicos disso, com matérias que são lembradas até hoje.
Você acha que jornalistas, apresentadores e comentaristas devem revelar o time para que torcem?
Resultado parcial
Total de 16851 votosO mais cômico foi Miura, um japonês que veio ao Brasil com um rico "paitrocínio", para aprimorar seu talento no futebol. Enquanto treinava, também aproveitava para conhecer as atrações do nordeste do país. Tanto que não teve muita vergonha em dizer em uma das matérias feitas ao lado de Canuto que o que mais o surpreendeu por aqui foram os bumbuns das brasileiras.
O outro caso célebre é o de Jacozinho, um jogador que virou febre quando participou de um jogo festivo do Flamengo em 1985 e fez um golaço depois de receber passe de Maradona. Canuto aproveitou a fama e fez uma série de matérias ao lado do jogador, a ponto de se começar uma campanha para que ele jogasse na seleção brasileira.
Canuto explica que sempre se deu bem em achar esse tipo de figuras, e que soube tirar o melhor que eles tinham a oferecer. "A força era do personagem. Eu tirava proveito disso. Era parceiro", explica ele, que este ano completou cinco décadas de profissão, depois de começar aos 17 anos no Diário de Alagoas. Confira a entrevista com o repórter, em que ele detalha seus causos hilários e conta que já tentou a sorte como goleiro:
Como você chegou ao trabalho de repórter esportivo?
Eu comecei em Alagoas. Passei por praticamente todas as editorias. Fiz polícia, política, geral e, principalmente, esporte. A cobertura esportiva foi fundamental para mim. O noticiário se concentrava em dois clubes – o CSA e o CRB. Então era um exercício de imaginação criar reportagens todo dia, apenas sobre dois times.
E como foi parar no rádio, que foi seu trampolim para a TV?
Como tinha conquistado alguns prêmios pelo trabalho no jornal, fui chamado para coordenar os textos do rádio. Mas não me conformava com o noticiário apenas lido. Resolvi experimentar o microfone, levando entrevistados ao estúdio ou carregando um gravador enorme para os estádios. Deu certo. Iniciei assim minha carreira de repórter e também no rádio.
Essa voz característica já existia no começo?
Esta voz rouquinha é marca de família. Os nove irmãos têm. E o que poderia me atrapalhar me beneficiou. Virou um cartão de apresentação. Chego nos lugares e o pessoal fica em dúvida se sou eu. Até falar! Aí acaba qualquer questão. No começo tive que criar um estilo de fala mais rápido e dinâmico, para sobreviver diante de locutores da voz bonita, grave e bem melhores do que eu. Rouco, ligeirinho e muito preocupado em informar, consegui meu espaço e o esforço foi reconhecido. Fui diretor de jornalismo da TV Gazeta, afiliada da Globo, e chefe de esportes de todos os jornais e rádios importantes da minha querida Alagoas.
O que você aprendeu trabalhando com esporte?
A grande lição que o esporte me deu: entender a alma do povo, sentir sua paixão e vivenciar momentos intensos de pura emoção. Sem demagogia, gosto de povo. Sinto-me bem no contato com minha gente. Isso desde o esporte até hoje no exercício do jornalismo comunitário, minha nova e grande paixão.
E o que mais gostava de fazer como repórter esportivo?
Fiz praticamente tudo o que sonhava. Em 1969, adolescente, cobri as eliminatórias da Copa para a Gazeta de Alagoas, com Pelé, Tostão, Gerson e companhia. Em 1998, já na Globo em São Paulo, fui à Copa na França. Posso dizer que falta uma Olimpíada. Acho que cubro este vazio em 2016.
Uma das matérias mais emblemáticas que você fez como repórter esportivo é a com o japonês Kazu Miura. Como surgiu aquela história?
Kazu foi um jogador japonês que veio ganhar experiência e se aprimorar no Brasil, no CRB. Imagino que ele foi o primeiro jogador patrocinado pelo pai que apareceu por aqui. O que ele ganhava no clube não pagava nem um terço das despesas com hotel de primeira, restaurante e carro conversível para aproveitar o verão nordestino. Era uma figuraça. Destaquei isso em reportagens para o Globo Esporte. Mostrei os dribles, a velocidade e seu fascínio pelas praias e pelas garotas de biquinis sensuais. Isso – e com toda aquela abundância – ele nunca tinha visto em sua vida. Adorou!
Uma das grandes cenas com o Kazu foi ele falando do que ele mais gostou por aqui: o bumbum das brasileiras. Foi algo de momento?
Tudo deu certo. Era engraçado como ele reagia, babando, com a beleza das praias de Maceió e com as belas mulheres de tanguinha. Por fim, Kazu justificou o investimento do pai: jogou no Santos e alguns clubes importantes do Brasil, voltou para o futebol japonês, teve destaque até na seleção e ficou milionário.
E teve o Jacozinho também, figuraça. As pessoas ainda te param na rua para falar dele?
Jacozinho foi um achado. Era pequenininho, jogava muito, superengraçado e criativo. Como se não bastasse, ainda tinha uma voz infantil. Um personagem espetacular. Com a devida distância da qualidade futebolística, era um Garrincha contemporâneo. Pena que ele tivesse sido descoberto já no final de carreira. Aplicava dribles desconcertantes, jogava bem pelos dois lados do campo, chutava forte e marcava muitos gols. E era tão carismático que o nome dele foi gritado por todo Maracanã num jogo que era para festejar a volta de Zico ao Flamengo. Parece incrível: fez um golaço, aproveitando um lançamento de Maradona (sim, ele, o craque argentino), dando drible da vaca no goleiro do Flamengo e colocando a bola, com tranquilidade, para dentro do gol. Uma explosão na torcida que tinha ido ver Zico e acabou aplaudindo também Jacozinho. Pena que o futebol perdeu muito do romantismo, da ingenuidade que Jacozinho foi um dos seus últimos representantes.
'Solidariedade com Chico Pinheiro'
- Marcio Canuto formou uma dupla famosa no jornalismo com o apresentador Chico Pinheiro, um torcedor fanático do Atlético-MG. Canuto conta que nunca houve rivalidade quando o tema foi futebol, por serem times sem grandes disputas."Chico Pinheiro é uma das figuras mais sensacionais e um dos profissionais mais completos que conheci. A grande paixão dele é o Atlético Mineiro. A minha é o Santa Cruz. Então, nenhuma rivalidade. Ao contrário: solidariedade nos momentos difíceis e vibração nos instantes de glória."
Como surgiu sua paixão pelo Santa Cruz?
Sou de Alagoas, mas meu time é o Santa Cruz do Recife. É uma espécie de gratidão por terem ajudado meu pai a morar, estudar e se formar como dentista. O Santa Cruz pagava a pensão do papai, numa época que não havia profissionalismo. O máximo era isso: uma ajuda de custo. Naquela pensão, o glorioso Luiz Canuto conviveu com Chacrinha, Capiba, Fernando Lobo e Ariano Suassuna.
Li que você era fã de George Foreman e até tinha um estilo como o dele. Você já tentou a sorte em algum esporte, como o boxe?
Fui atleta de muitos esportes. Joguei no gol para seguir a inspiração do meu pai, mas pratiquei basquete, handebol, fui recordista de salto em altura e arremesso de peso e treinei um pouco o boxe. Fã mesmo fui de Muhammad Ali, um fenômeno que "tinha a leveza da borboleta e a ferroada da abelha".
Você sente saudades de trabalhar mais com esporte?
Fico contente quando sou convocado para participar do Globo Esporte e Esporte Espetacular. Quem sabe não participo da Copa? Mas descobri que também sou feliz fazendo o jornalismo comunitário, ajudando muita gente a resolver problema que as autoridades ignoram ou são insensíveis. Participamos da melhoria da qualidade de vida de milhões de pessoas em São Paulo. Isso não tem dinheiro que pague.
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