Turner sobre parceria com Globo para evitar apagão: "Fora de cogitação"
Chico Silva
25/04/2019 08h00
Novo vice-presidente de esportes da América Latina da Turner, Fábio Medeiros conta as horas, minutos e segundos para 19h de domingo. Nesse horário, Palmeiras x Fortaleza entrarão em campo para marcar uma nova era do futebol na TV paga no Brasil. Pela primeira vez na era dos pontos corridos, um canal que não é do Grupo Globo, no caso a TNT, transmitirá uma partida de Série A de Campeonato Brasileiro.
Ao UOL Esporte Vê TV, o chefe do canal relembra o processo de compra dos direitos do Brasileirão, fala da conturbada e difícil relação com a concorrente e rival Globo e conta como será assistir ao jogo sem estar ao lado dos amigos que tornaram o que era um sonho bem distante na mais nova realidade do mercado de TV do país.
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Você está na contagem regressiva para o Palmeiras x Fortaleza de domingo. Como a Turner conseguiu se tornar a primeira empresa fora o SporTV, na TV paga, a transmitir o Campeonato Brasileiro?
"Foi um projeto que nasceu há muito tempo, quando percebemos uma oportunidade que numa época parecia bem improvável. Era um sonho bem distante. Mas a gente foi construindo aos poucos. Começamos a nos envolver com futebol brasileiro com a Copa do Nordeste. Ali percebemos que havia uma janela para novos projetos. Em 2014 começou a ficar mais real, já com o suporte financeiro muito forte da Turner, que entendeu a possibilidade e a oportunidade que isso poderia trazer. Eles entraram no Esporte Interativo antes mesmo da compra de 100% do canal. Desde então começamos a conversar sobre projetos futuros. Isso naturalmente não teria sido possível sem o investimento deles (Especula-se em cerca de R$ 300 milhões/ano. Isso fora as luvas pagas nas assinaturas dos contratos em 2016. Medeiros não confirma o número). A gente sabe que o futebol local é sempre o principal direito do país. Até mais importante que o da Champions League por exemplo. Vai além da racionalidade do torcedor. Por mais que o time dele esteja ruim, ele quer vê-lo jogar."
Vocês enfrentaram grande resistência da Globo, que fez o que pôde para garantir seu monopólio nas transmissões do Brasileiro no SporTV. Como pressão impôs até um redutor de 20% nas cotas dos clubes que assinassem com a Turner/EI. Como você analisa a postura da concorrente? Foram éticos ou jogaram o jogo do mercado?
"Prefiro não comentar a estratégia da concorrência."
Em algum momento o EI/Turner se sentiu prejudicado pelas manobras e ações da Globo durante as negociações? Pensou em tomar alguma medida judicial para assegurar a lisura e ética do processo?
"Sobre esse assunto o que posso dizer é que respeito a concorrência e acredito que ela seja salutar e indispensável para o desenvolvimento do futebol brasileiro."
É possível algum acordo de parceria ou co-cessão de direitos para que os jogos entre times da Turner e da Globo sejam exibidos pelos canais dos dois grupos?
"Isso hoje está fora de cogitação."
O que o torcedor dos sete times que assinaram com vocês irá ver de novo a partir do próximo domingo?
"A gente sempre teve um pouco esse negócio de trazer o torcedor para dentro da transmissão. Desde a Copa do Nordeste mostramos mais a torcida, aumentamos o som da arquibancada. Uma das novidades é que vamos fazer um tratamento sonoro diferente. Para isso a ideia é fazer uma operação de áudio assistida. Vamos abrir o microfone no ataque de cada time para ver qual lado da torcida está vibrando mais. Queremos que o torcedor se sinta dentro do estádio. Outra coisa é que cada um dos 20 times do Brasileirão terá um torcedor-símbolo na programação e nas transmissões dos jogos."
Pode-se afirmar que o torcedor será o protagonista das transmissões da Turner/EI no Brasileirão?
"Nossa missão será entregar um Brasileirão como nunca se viu antes. Isso engloba ter o torcedor mais presente, criar uma emoção mais intensa nas transmissões e ter um ângulo e enfoque digital inéditos. A gente sabe que quando tem um jogo decisivo o torcedor acorda pensando naquilo. Somos um grupo formado por fanáticos. Então entendemos o comportamento deles desde quando acordam, o que querem consumir às dez da manhã, o que querem ver quando falta uma hora para o jogo começar e o que querem receber no celular no final da partida. Entender essa demanda a cada hora do dia e em cada device é o nosso grande diferencial. Queremos criar uma experiência para cada plataforma, para cada torcedor, para cada sentimento. Entender a dinâmica de como o torcedor lida com essas coisas é fundamental."
Então o estilo "emotivo" dos jogos da Liga dos Campeões, que para muitos não passa de gritaria, vai continuar no Brasileiro?
"Esse não tem muito como mudar. É a parte mais difícil. Transformar a vida das pessoas através da emoção do esporte é o que nos faz acordar todo dia. Esse é o nosso DNA e o grande responsável pelo sucesso do nosso engajamento. Fazemos desse jeito pois de fato acreditamos que aquilo muda a vida das pessoas, nem que seja por 10 segundos. Não vamos agradar todo mundo nunca. Mas quando olhamos os resultados, toda semana quebramos o recorde de audiência na Champions League, parece que tem bastante gente concordando conosco. Então não tem como mudar."
O fato de a Turner ter pagado um valor extra ao Palmeiras no ato da assinatura do contrato causou desconforto com os outros seis clubes parceiros. Depois houve compensação para alguns deles. Até o fechamento dessa reportagem apenas o Fortaleza não havia chegado a um acerto. Até o apito inicial de domingo estará tudo resolvido?
"As conversas com os clubes estão indo bem. São detalhes finais. A gente nunca teve nenhuma preocupação com contrato. Sempre cumprimos tudo como tinha que ser. Agora chegando mais próximo da competição naturalmente estamos sentando com todos eles, até porque a gente não quer ser apenas os donos dos direitos. Queremos ser parceiros deles. Pretendemos fazer até acima do que está no papel. Iremos realizar um road tour pelos clubes para explicar a dinâmica de redes sociais, como o digital pode ajudá-los e uma série de iniciativas que não têm a ver com os contratos, desde sócio torcedor a como eles conseguem gerar mais receita. Quando tiramos os canais do ar eles demoraram um pouco para entender o que estava se passando. Com isso reagiram de uma maneira um pouco confusa. Não sabiam o que estava acontecendo, onde os jogos seriam transmitidos. Mas a gente sabia que com um pouco de calma e chegando mais perto do campeonato chegaríamos a um acordo com todo mundo. É o que estamos buscando."
Houve uma equiparação das condições e valores oferecidas ao Palmeiras, certo?
"Estamos equiparando. O Palmeiras tinha algumas propriedades extras que os outros clubes estão tendo agora. Muita coisa foi falada sem muita base. O jogo de despedida do Zé Roberto, por exemplo, apareceu depois e foi um negócio legal que fizemos com eles. Todos esses detalhes e oportunidades estão sendo avaliadas agora. Isso é importante para nós. E se aparecerem outras oportunidades de parceria com os clubes vamos fazer. Seja agora ou daqui um ou dois anos. Mas reforço que os contratos sempre foram cumpridos."
O fim do Esporte Interativo causou grande comoção entre os fãs do canal e pegou o mercado de surpresa. Como vai ser para você no domingo não estar ao lado de profissionais que construíram esse projeto desde o início e verão os jogos como meros torcedores?
"Não é fácil. Mais do que profissionais são amigos que fiz na vida. O que construímos juntos no Esporte Interativo é eterno e ninguém vai apagar. A gente continua acompanhando o trabalho deles. Inclusive quando falam de Brasileirão no nosso grupo de Whatsapp continuam vibrando como se estivessem aqui. Dão ajuda, informação. No fundo, no fundo, o sentimento é que o projeto é deles também. Tenho certeza que no dia estarão muito felizes. Mas na vida é assim. A gente perde uma coisinha aqui, mas ganha outras também. Aqui chegou gente nova e muito legal que veio depois da saída deles. Mais do que chorar o leite derramado temos que olhar para frente. Eles, por serem brilhantes, serão muito felizes no que fizerem e vou vibrar com as conquistas deles também. A gente brinca que a saída deles foi boa para o mercado brasileiro, pois espalhou um monte de gente talentosa por aí."
Comenta-se que a marca Esporte Interativo em breve será descontinuada pela Turner. Isso de fato acontecerá? E quando?
"Sempre pode acontecer de tudo. Mas não tem nenhum plano agora. A gente hoje, até por ter uma função não só Brasil, olha para a América Latina como um todo. A estratégia está sendo decidida. Com todo o apego que eu possa ter pelo EI tenho que pensar profissionalmente no que for melhor para a empresa e no que faz mais sentido para essa marca ou para uma nova que possa surgir. O assunto não está em pauta, mas se a gente achar que por algum motivo tenha que mudar, vamos analisar. Durante esses anos de EI algumas vezes pensamos em mudar a marca. Talvez uma coisa mais moderna, mais curta. Mas tudo será analisado profissionalmente e ao seu tempo."
Na entrevista com o corintiano André Henning, publicada ontem ele afirmou que, em caso de Palmeiras e Corinthians chegarem empatados em pontos na última rodada, ele torceria para o arquirrival do time do coração para ter a chance de narrar seu primeiro título brasileiro. Para você esse "drama" hoje está distante (Medeiros é torcedor fanático da Portuguesa). Mas você vai torcer para os times da Turner no Brasileirão?
"A gente faz a Champions e eu particularmente não gosto do Barcelona. Mas torço por ele porque tem muita gente que gosta e quer ver os jogos dele. Infelizmente o CR7 saiu da Champions e para mim foi ruim por duas razões: uma porque eu sou muito fã dele e outra porque muita gente não vai mais vê-lo em ação. Naturalmente você torce para esses caras pois seu produto vai ficar mais atrativo e nossos jogos vão ter mais apelo e audiência. O Palmeiras ter sido campeão brasileiro foi muito importante pra gente. Começamos o ano transmitindo o jogo do campeão da Série A com o campeão da Série B, o Fortaleza. Você vai trabalhando com o futebol e aprende a separar a parte pessoal da profissional. Eu vou para estádio tomar chuva para ver meu time disputando vaga na Série D. Mas claro que estamos olhando para o produto que a gente tem e torcendo para que os nossos clubes tenham mais destaque para podermos ter mais audiência e visibilidade."
Então agora você vai ter dois motivos para torcer contra o Corinthians…?
(Risos)
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