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Cabrini teve missão dura: “Ayrton Senna está clinicamente morto”

UOL Esporte

01/05/2014 06h00

Cabrini
Receber a informação de que uma pessoa muito próxima morreu não é nada fácil. Imagine então ter que ouvir essa notícia, ter pouco tempo para sentir qualquer emoção e ter que propagá-la para o Brasil inteiro instantes depois. E o país todo vai entrar em choque ao ouvir aquilo. Essa foi a missão do jornalista Roberto Cabrini, hoje no SBT, ao anunciar ao vivo no boletim da TV Globo a morte de Ayrton Senna no 1º de maio de 1994.

Ele foi correspondente internacional por quase uma década na emissora carioca e por muito tempo cobriu não só a Fórmula 1, mas também em detalhes a vida do tricampeão mundial. Assim como Galvão Bueno, era um dos mais próximos do piloto.

"Tínhamos uma relação de quatro anos. Todo mundo se lembra do Senna herói. E eu conheci o ser humano por trás do herói. Foi algo muito prazeroso cobrir a Fórmula 1 com ele ", lembrou, em entrevista ao UOL Esporte.

Há algumas semanas, o jornalista fez um especial no SBT, em seu programa, Conexão Repórter, sobre a relação com Senna e as últimas lembranças antes da morte. O programa será reprisado no dia 1º. Cabrini lembra que Senna estava tenso o fim de semana todo, com semblante e feições diferentes das rotineiras em outras etapas da Fórmula 1.

"Jamais tinha visto um ambiente tão sombrio. Era uma sequência de eventos que jamais a Formula 1 assistiu, com o acidente de Barrichello e a morte de Ratzenberger (nos treinos). O próprio Senna foi um dos primeiros a entrar no posto médico e falei com ele na saída. Ele estava preocupado. Estava pesado e tinha me falado alguns dias antes, em uma entrevista, o quão crítico estava o carro da Williams. Aquele ano foi o pior carro da Williams na época. Ele dizia que o projeto estava com vários problemas", lembrou.

 

Ele lembra que logo depois que houve o acidente já abandonou o circuito de Imola e foi direto ao hospital. Desde aquele momento sentia que a situação do tricampeão mundial era muito delicada e quase irreversível. "A caminho do hospital eu já tinha a nítida noção que naquele dia eu teria que anunciar a morte. Depois, no hospital, os boletins foram piorando."

Eis que ele recebeu a informação dos médicos e teve que dar a notícia em primeira mão para todo o Brasil ao vivo. Teve pouco tempo para sequer sentir a emoção pessoal antes da atitude profissional e pronunciar uma das frases memoráveis de seu boletim: "Ayrton Senna da Silva está clinicamente morto."

"Eu tinha que ser preciso e colocar um pouco de emoção, pois sabia que ele era um ente querido para o país. Era um momento difícil, eu tinha convivência com o Ayrton. Mas não tinha o direito de que a emoção tomasse conta de mim. O fato de ter que me concentrar serviu para enfrentar a parte emocional. Eu tinha um missão, e aquilo não poderia influenciar", lembrou.

"O Ayrton parecia um cara imortal pela segurança e coragem que ele tinha. Anunciar a morte de um cara como ele não batia, não combinava. O Senna era uma fortaleza emocional. Era difícil assimilar que um cara como ele morreu."

Poucos meses depois, Cabrini deixou de cobrir a Fórmula 1 para se dedicar exclusivamente ao jornalismo investigativo, uma marca em sua carreira até os dias de hoje. Diz que a morte de Senna o fez decidir pelo fim do ciclo no automobilismo.

"Achei que sem o Senna eu tinha encerrado um capitulo da minha carreira, e a morte do Ayrton indica o início da etapa de outro ciclo. Eu não queria mais continuar na Fórmula 1 e tomei a decisão de me dedicar som ao jornalismo investigativo e internacional. Não havia mais sentido ficar cobrindo aquilo. Foi um ciclo que se fechou", finalizou.

José Ricardo Leite
Do UOL, em São Paulo

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