Confusões recentes trazem à tona incômodo entre jornalistas e boleiros em debates na TV

A recente discussão entre Alberto Helena Jr e Carlos Alberto Parreira no Sportv, além do entrevero entre Rodrigo Bueno e Mário Sérgio na Fox Sports, deram margem a uma discussão: cabem jornalistas e boleiros nos debates esportivos da TV? O UOL Esporte entrevistou profissionais da área que defenderam a liberdade de imprensa nas mesas redondas, mas admitem incômodo com a pluralidade de opiniões em alguns aspectos.

No Brasil, não existe um padrão para a presença de ex-atletas e jornalistas em transmissões esportivas. Nos Estados Unidos, a equipe de comentaristas das emissoras de TV geralmente é formada por ex-jogadores, enquanto os profissionais de imprensa se concentram nas reportagens e elaboração de matérias.

O jornalista Rodrigo Bueno se envolveu em polêmica com o técnico Mário Sérgio no começo do mês passado, durante o programa Fox Sports Show. Rodrigo questionou a qualidade dos treinadores brasileiros, o que deixou Mário irritado. "Você não pode dizer que os técnicos lá de fora são melhores que os nossos. Você falou, inclusive, que nossos técnicos são incompetentes, você não tem capacidade para afirmar isso", disparou na ocasião.

Logo em seguida, Rodrigo Bueno rebateu o ex-treinador. "E você tem capacidade para falar o contrário?". Resposta essa que ganhou outra crítica de Mário Sérgio. "Tenho, e mais do que você. Eu trabalhei no meio. Você não", completou o ex-técnico. O jornalista não titubeou e mandou a tréplica. "E daí? Você perdeu muito".

Apesar do entrevero com Mário Sérgio, Rodrigo Bueno defende a tese de que as mesas redondas da TV devem contar também com a presença de boleiros. O jornalista citou o caso de Tostão, colunista da Folha e tricampeão do mundo com a seleção brasileira, para ressaltar a importância de que os ex-jogadores se preparem academicamente para a função de comentarista.

"A presença de quem esteve no meio é muito importante. Mesmo assim, acho sempre bacana que o ex-jogador que vá para o meio da imprensa se prepare da melhor forma, talvez até fazendo curso de comunicação. Aqui na Fox, a gente tem o Simon [Carlos Eugênio, ex-árbitro] que agora é jornalista diplomado", argumentou Bueno.

Em entrevista recente ao UOL Esporte, Mário Sérgio falou sobre a discussão com Rodrigo Bueno e defendeu o debate de opiniões, apesar de admitir que ficou incomodado pelo fato de o jornalista ter criticado a classe que ele já fez parte (treinadores brasileiros).

"Ali, na discussão, eu não estava na posição de técnico, estava como comentarista. E o vi denegrir a imagem de toda uma classe. Isso eu não concordo. Tenho uma opinião diferente e a coloquei no programa".

O entrevero entre o jornalista e o boleiro foi bem visto pela alta cúpula da Fox Sports. "Respeitamos a opinião dos nossos contratados e as discussões técnicas entre eles são bem-vindas, na medida em que elevam o nível de informação sobre os temas discutidos", justificou Eduardo Zerbini, vice-presidente da emissora no Brasil.

Comentarista do programa Bola Dividida, da RedeTV, o jornalista Juarez Soares acha válida a presença de boleiros em mesas redondas somente como convidados, por avaliar que apenas profissionais do jornalismo podem integrar a bancada fixa dos debates esportivos na TV.

Juarez aproveitou para defender Rodrigo Bueno no episódio com Mário Sérgio. "Achei a posição dele absolutamente correta, achei fodi… Não é porque você não esteve lá que não pode comentar".

Apresentador do programa Donos da Bola, da Band, o ex-jogador Neto tem o costume de manter na bancada pelo menos um comentarista boleiro e um jornalista. Ele disse ter tomado conhecimento do veto de Juarez Soares, a quem ele considera uma referência na televisão, mas não quis entrar em polêmica com o comentarista da RedeTV.

Neto defendeu a liberdade de expressão e mostrou incômodo com as opiniões extremistas sobre o assunto. "Acho um preconceito muito grande de quem acha isso. Até porque não é porque jogou futebol que você sabe mais do que quem não jogou, assim como não é porque você é jornalista que tem direito de estar numa mesa redonda".

A opinião de Neto foi compartilhada por Renato Nalesso, diretor do mesmo programa. Ele argumentou que não faz distinção entre jornalistas e boleiros na escolha dos convidados da atração, que é transmitida nas tardes de segunda à sexta na Band. "Eu acho que uma 'mesa redonda' deve ser formada por profissionais que entendam de bola, independente se foram jogadores ou não. Esse negócio de preconceito de uma parte ou de outra não está com nada. É ridículo na verdade".

Presidente da Associação dos Cronistas Esportivos do Estado de São Paulo (Aceesp), Luiz Ademar não concorda com a ideia defendida por Juarez Suares de que os boleiros ocupam o lugar dos jornalistas em alguns nichos do mercado de trabalho. O comentarista do Sportv citou exemplos do seu local de trabalho para defender esta ideia.

"Vejo o Sportv valorizando os jornalistas e também tem os boleiros. A Globo, por exemplo, só tem ex-jogadores, o que é uma opção dela, pois entendeu que o cara traz audiência. Para a Globo não precisa ser jornalista trata, pois ela trata o esporte como entretenimento, isso tem que  ser respeitado", falou Ademar. "Acredito que nosso espaço existirá sempre. Trabalho ao lado do Muller, Roger, Belletti, e não vejo meu espaço atrapalhado em nada".

Renan Prates
Do UOL, em São Paulo