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Narradores recordam apuros e situações cômicas vividas em transmissões

UOL Esporte

14/01/2018 04h00

Rogerio Jovaneli
Do UOL, em São Paulo

A convite do UOL Esporte vê TV, narradores esportivos toparam compartilhar com o blog histórias marcantes vividas durante transmissões esportivas. Aquele momento de aperto, de sufoco, o imprevisto que preocupou na hora e virou alívio no fim. O erro grave que passou, mas também o acerto que virou recordação especial. Confira:

André Henning detonou jogo que narrou e ganhou apoio de telespectadores

Um dos narradores mais elétricos, empolgados da TV esportiva brasileira, André Henning, do Esporte Interativo, recordou com bom humor uma barreira intransponível à animação habitual dele: "o pior jogo de todos os tempos", assim definiu. Uma partida tão ruim, mas tão ruim que o fez jogar aberto, ser super sincero com o telespectador sobre a péssima qualidade do espetáculo e até pedir a solidariedade, não ser abandonado. E deu certo:

"Copa Africana das Nações de 2010, Nigéria e Zâmbia, jogo de quartas de final, se não me engano. Como narrador tem que fazer, é a função dele fazer com que o jogo seja atrativo, faça com que o cara que esteja ali fique vendo a gente, o que esteja passando queira ver um pouquinho, enfim, vender algo de bacana que esteja acontecendo no jogo. O jogo estava muito ruim, mas muito ruim. Pô, os caras não acertavam três passes seguidos."

"Um tocava para o outro e errava o passe, aí o outro time recuperava, dava dois passes e no terceiro erravam. Não tinha um chute a gol, um jogo muito ruim, e eu tentando, me esforçando: 'É agora, quem sabe?, pá', e o cara errava. Estávamos eu e Vitor Sérgio Rodrigues. Cara, chegou uma hora que não deu mais e fui contra todos os manuais de narrador de televisão e passei a esculhambar o jogo."

"Lembro que teve uma hora que o cara foi chutar a gol e mandou a bola na linha lateral. Eu não aguentei e disse: 'Seguinte, gente, não dá mais. Tentei, me esforcei, mas não dá mais, o jogo é muito ruim, só que é o seguinte: assistir Manchester e Chelsea aqui todo mundo quer – a gente fazia Campeonato Inglês -, assistir Barcelona e Real Madrid todo mundo quer, Liverpool e Arsenal, aí é fácil."

"Quero ver ficar com a gente na podre, também. Ficar na boa é mole. Hoje, quero ver, ninguém vai nos abandonar, vamos ficar juntos aqui, somos parceiros ou não somos?'. Cara, começou uma manifestação, não lembro nem qual era [o meio de interação], acho que era só SMS, mas nego começou a ir com a gente: 'Caraca, bicho, tá louco, o jogo é muito ruim, André, mas tamo junto, não vamos te abandonar'."

"Bicho, eu fui completamente contra a maré do que todo coordenador falaria no meu ponto, do tipo: 'Pô, tenta valorizar'. Chegou uma hora que eu não aguentei: 'Esse jogo é muito ruim'. Tanto que foi 0 a 0, 0 a 0 na prorrogação e ainda foi para os pênaltis aquela porcaria [Nigéria avançou com triunfo por 5 a 4]."

"Mas não aguentei, apelei para que o telespectador não nos abandonasse, ele não nos abandonou e até hoje recebo mensagem no Twitter de gente que lembra daquele jogo: 'Caraca, André, aquele jogo foi muito ruim'. Enfim, foi um caso dos mais curiosos que aconteceu comigo, o pior jogo de todos os tempos que eu narrei e que tive que falar para o telespectador que era o pior jogo de todos os tempos."

Milton Leite recorda grito de gol especial para o primeiro de Ronaldo no Corinthians

Um dos principais narradores do SporTV, mas também com algumas narrações pela Globo, Milton Leite considera a narração do primeiro gol de Ronaldo como um dos momentos mais marcantes no exercício da função. E o grito de gol teve direito à preparação especial, revelou:

"Um dos momentos recentes que mais gosto, entre as minhas narrações, foi o primeiro gol marcado pelo Ronaldo com a camisa do Corinthians. Eu sabia que havia uma boa possibilidade de eu ser o narrador no jogo em que conseguisse marcar o primeiro gol."

"Por ser ele um jogador muito acima da média, entre os melhores da história, achei que sua volta ao Brasil merecia uma narração especial no primeiro gol, por isso preparei uma frase especial para aquele gol, que não saiu no primeiro jogo dele contra o Itumbiara, pela Copa do Brasil, mas no seguinte, pelo Campeonato Paulista, contra o Palmeiras, em Presidente Prudente."

"Ele não só fez o gol contra o maior rival, como foi no último minuto e evitando a derrota. Antes de gritar gol, eu gritei: 'Senhoras e senhores, o Fenômeno voltou'. E só aí o gooooollll! Ficou tecnicamente muito bom, em minha opinião, marcou bem aquele momento e um gol dramático, em cima da hora, num clássico."

Odinei Ribeiro precisou de carona de motoboy para não perder transmissão 

Hoje no SporTV, Odinei Ribeiro, conhecido pelo "por todos os ângulos" em suas narrações, passou apuro em seus tempos de Campeonato Espanhol na SKY para não perder o início de uma transmissão:

"Antes do SporTV, eu fazia freela do Campeonato Espanhol na SKY. E em um certo dia, saí de casa com destino à emissora, que era em Barueri, peguei um baita trânsito e bateu o desespero. Então eu resolvi pedir carona para um motoboy. Parei em frente a uma empresa e pedi ajuda a um motoboy, que pegou emprestado outro capacete e me levou até a sede da emissora."

"Ele foi cortando os carros pelo corredor e depois de muitos apuros eu cheguei antes do apito do árbitro. Na hora do pagamento, eu vi que não tinha dinheiro, só cartão e cheque. Dei um cheque a ele com o dobro do valor pedido. Ambos satisfeitos."

Téo José desclassificou piloto brasileiro por engano e recorreu à garrafinha por xixi na Copa

Hoje o principal narrador do Grupo Band, Téo José relembrou um equívoco de informação nos tempos de Rede Manchete em seu primeiro ano narrando Fórmula Indy:

"Em 1993, meu primeiro ano de Fórmula Indy, isto na antiga Rede Manchete, a terceira corrida foi em Phoenix, minha primeira de circuito oval e como era curto, muito rápido, as pessoas ficaram na minha cabeça que seria uma prova bem mais difícil que as anteriores em circuitos de rua. Minha preocupação era não perder a história da prova, porque em ovais curtos logo os retardatários se misturam com os primeiros e a cronometragem na época não tinha tantos recursos como hoje. Prova começou e logo eu vi que realmente a pista ficava cheia e a atenção tinha de ser redobrada, sem falar que ainda estava me acostumando com a categoria, era um ano de estreia.

"Apesar de estudar bastante e perguntar para as pessoas envolvidas, era muita informação nova. Em determinado momento, surgiu uma bandeira preta para o brasileiro Marco Greco, que também fazia sua temporada completa de estreia, nunca tinha marcado ponto. Como estava acostumado com bandeira preta em outras categorias, já disse na hora que estava desclassificado e não mais me preocupei com ele. Só que na Indy a bandeira preta significava a obrigatoriedade de ir para os boxes e verificar se o carro tem algum problema.

"Minha surpresa foi geral quando terminou a prova e peguei a folha de classificação: devido a muitos abandonos, ele completou em décimo, marcando seus primeiros pontos, mas aí a transmissão já tinha acabado. Pior, os jornais no Brasil faziam a cobertura pela TV e todos deram a desclassificação dele, sendo que na verdade ele acabara de conquistar seus primeiros pontos na categoria. Na volta por Los Angeles, entro no avião e a primeira pessoas que encontro foi o Marco Greco que, lógico, com cara feia, me deu uma bronca. Eu só tinha uma coisa a fazer: pedir desculpa pelo meu erro."

O narrador da Band ainda recordou sufoco que passou na época que esteve no SBT, apertado para ir ao banheiro, em plena transmissão da Copa do Mundo de 1998 no Stade de France:

"Na Copa da França em 1998, estava dividido entre o Mundial e a cobertura da Fórmula Indy no SBT, tanto que no dia da final fiz a prova de Cleveland nos Estados Unidos. Narrei apenas um jogo do estádio, quartas de final entre França e Itália. Bebo muita água durante os eventos e não foi diferente nesse dia. No intervalo tentei ir ao banheiro, mas estava uma fila monstra e no SBT o narrador participava do intervalo. Não daria tempo. Voltei para posição e não resolvi meu problema. Jogo termina empatado, 0 a 0, vai para a prorrogação, sem intervalo comercial e a vontade de urinar só aumentava."

"E, pior, o empate sem gols seguiu, então pênaltis. Não dava para segurar, já atrapalhava a concentração, então não tive dúvida: era ali mesmo, na posição de narração aberta. Não era cabine, como sempre não é em Copas do Mundo e resolvi meu problema utilizando duas garrafinhas de água vazias. Numa situação dessas, você nem olha para o lado para ver se alguém o está observando. Na maior cara de pau, continuei o meu trabalho e narrei a classificação da França [que mais adiante viria a ser a campeã e ali faria 4 a 3 na disputa por penais], com o estádio completamente lotado."

Por necessidade de ida ao banheiro, Marcelo do Ó suou frio durante MMA na RedeTV! 

"A história é antiga, dos tempos que transmitia o Xtreme Fighting Championship – XFC. Num desses eventos, o terceiro deles, no dia do meu aniversário, 1º de abril, em 2014, nós ficamos mais de duas horas ao vivo, sem intervalos, transmitindo as lutas no card principal dentro dos estúdios da RedeTV!. Narrei com Fernando Navarro nos comentários e Lucilene Caetano na apresentação das lutas. Antes havia gravado os combates do card preliminar, que eram exibidos durante os finais de semana sem eventos ao vivo na TV. Muito bem, combate principal, Luis Sapo Santos fez uma luta fantástica e aplicou um nocaute fenomenal no mexicano Alfredo Morales, o 'Tsunami'. Durante a luta já estava apertadaço e implorando por um pit stop. Sabe quando você começa a suar frio?"

"Combate rolando, a adrenalina do MMA, a gente tem que ficar ligado, e eu não sabia mais se pensava no hexágono ou no vaso sanitário. Ao final da luta, era apenas anunciar o vencedor, a entrevista do Fernando Navarro com o ganhador e aí era fim de transmissão, mas eu não aguentava mais. Estava ao vivo e não dava para tentar nenhuma artimanha, como por exemplo usar uma garrafinha. Não tive dúvida, sem nenhum aviso prévio, assim que a luta acabou, pouco depois de pedir um break, deixei a turma do bastidor absolutamente desesperada. Chamei o intervalo e saí correndo, porque realmente eu ia fazer nas calças. Corri lá, fiz o xixi e corri de volta. Encerrei a transmissão com uma calma quase de um monge budista e celebramos uma excepcional audiência naquele dia."

Para não perder jogo, Gustavo Villani e PVC foram de camburão da polícia na Olimpíada

Gustavo Villani, um dos principais narradores do FOX Sports e Paulo Vinicius Coelho, renomado analista de futebol da emissora, foram levados de camburão da polícia em Brasília. Sim, isso aconteceu, mas por uma boa razão. Escalados para a transmissão de partida da seleção olímpica nos Jogos de 2016, eles corriam risco de não chegarem a tempo na posição de transmissão no estádio Mané Garrincha:

"A gente foi fazer Brasil e Iraque, Olimpíada Rio-2016. Tivemos um imprevisto na logística e Paulo Vinicius Coelho e eu chegamos em Brasília 1 hora antes do jogo. Lembro da gente olhar no relógio, faltava 1 hora para o início e a gente dentro do avião. Corremos em todos os instantes para pegar o táxi no aeroporto. Faltavam 2 quilômetros mais ou menos para chegar ao estádio e percebemos que não ia dar. Muito trânsito, vias fechadas, descemos do táxi e corremos. O PVC com uma mochila pesada pra caramba, eu de uniforme, preocupado em não amassar, não chegar suado, mas àquela altura dane-se, o importante era chegar."

"Percebemos que não daria tempo, que precisávamos de ajuda, então pedimos carona para dois motoqueiros da polícia, mas eles disseram que não poderiam abandonar o posto e seguimos correndo. Aí abordamos uma viatura policial, um camburão com dois policiais na frente e três atrás, com metralhadoras para fora, apontadas para cima, aquela cena. Quando os caras viram o nosso desespero, o nosso olhar já de desalento, os três de trás desceram e o piloto e copiloto levaram PVC e eu de viatura até a boca da entrada da imprensa no estádio."

"A gente chegou na posição de transmissão 1 minuto antes da bola rolar. Estava na execução do hino já. Deu tudo certo no final, mas sem dúvida nenhuma foi o maior perrengue que passei em uma transmissão. Eu me lembro da gente comemorando feito criança, parecia que tínhamos ganhado Copa do Mundo, de ter conseguido chegar na cabine. Dois caras com as línguas de fora, suados, mas em tempo de pegar o início do jogo."

Paulo Andrade narrou sem ver imagem de jogo na ESPN Brasil

Principal narrador de futebol da ESPN Brasil, Paulo Andrade ancorou inúmeras grandes transmissões na emissora, mas já passou um baita sufoco certa vez, quando precisou narrar o início de uma partida cujas imagens não podia ver. Confira, a seguir, essa história marcante da carreira do profissional:

"Copa América de 2011 na Argentina. Fizemos em "tubo" (do estúdio) Uruguai e Peru e eu, como sempre, tinha uma pancada de informações para poder passar durante a transmissão. O jogo estava para começar, hinos nacionais e tudo e faltando uns dois minutinhos para a bola começar a rolar, aconteceu uma pane geral no estúdio onde a gente estava e o que aconteceu? Apagou a imagem das televisões que tínhamos lá para narrar e comentar."

"Apagou tudo, as luzes e a gente ficou basicamente no breu. Só que quem estava em casa tinha tudo normal, imagem do jogo, o nosso áudio. Naquele momento, não poderia dizer: 'Ó, estamos aqui com uma pane no nosso estúdio, eu não estou vendo nada, não sei o que está acontecendo, eu não sei de nada'. Quem estava na coordenação dizia no meu fone: 'Pessoal está correndo, vai resolver'. Mas esse 'vai resolver' demorou quase dez minutos. "

"Até foi cogitada uma mudança de estúdio, mas aí acarretaria bem mais trabalho, uma mudança muito drástica. O que eu poderia fazer naquele momento, sem imagem, narrando um jogo de abertura, com a bola rolando? Podia recorrer às minhas informações. Então, o cara que estava coordenando o jogo no meu ouvido falava assim: 'Peru com a bola'."

"E eu falava no ar: 'Seleção peruana trabalhando aí'. E pegava uma das minhas informações e lia: 'Essa é a 14ª Copa América da seleção peruana, a melhor campanha foi tal, tal, tal'. Aí o cara: 'Ó, escanteio para o Uruguai'. Eu ouvia o som da torcida. 'E agora vai o Uruguai, primeiro escanteio do jogo', dizia, tentando disfarçar o máximo que podia e torcendo para não acontecer um gol, porque ia ser uma coisa catastrófica narrar um gol sem ver o gol."

"Só com mais ou menos oito minutos de jogo é que a imagem voltou para a gente. Lembro que eu suava. Foram os oito minutos mais tensos da minha história narrando uma partida de futebol, até que a imagem voltou e pude narrar normalmente, após os engenheiros resolverem, mas foi muito louco, porque narrei sem ver, sem ter a imagem do jogo, e o cara que estava na coordenação falava o básico do básico para mim: 'Uma falta para a seleção peruana, ficou caído o número 10'. E eu olhava na minha relação e falava, suponhamos: 'O Cueva caiu, falta para a seleção do Peru, que na temporada passada fez tantos jogos, venceu tantos, perdeu tantos'."

Eu ia preenchendo o vazio, não com o que o cara estava olhando, não com a narração do jogo em si, mas pontuando a narração, conforme o que ouvia do coordenador e com as informações que tinha. No final das contas, deu certo, não houve gol. Lógico, foi uma catástrofe. O telespectador em casa deve ter falado: 'Esse cara não está a fim de narrar o jogo, só tá a fim de conversa, só de resenha, de informação. Lógico que não acionei nenhuma vez o comentarista, mas foi muito engraçado narrar por oito minutos um jogo que não estava vendo."

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