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Que gracinha! Como Hebe Camargo ajudou a carreira de Paulo Andrade

UOL Esporte

30/04/2015 06h00

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Narrar jogos de futebol era algo em que ele nunca havia pensado. Nem quando tinha um programa de samba em uma rádio comunitária. Muito menos quando começou a trabalhar em uma televisão no ABC. "Era um trabalho voluntário. Eu era comentarista e um dia, faltou o narrador. Fui obrigado a fazer", lembra Paulo Andrade.

Fez e não gostou do resultado. Mas percebeu que tinha um dom. E que precisava correr atrás. "Narrar futebol é um dom. Eu tenho esse dom e fui aprimorando, percebi que era o que eu queria na vida".

Começou a narrar incessantemente na TV voluntária. Não ganhava nada, mas conseguiu horas de áudio para gravar uma fita de dez minutos. "Como aqueles de jogadores de futebol. Só entrava o que estava bom".

Com a fita pronta, passou a ligar. Não havia opção. Ligou para todas as possibilidades e não aceitava o pedido de enviar a fita. "Eu queria entregar em mãos. Queria que a pessoa visse nos meus olhos a minha vontade de ser narrador. Pedia cinco minutos da vida da pessoa. Fui para o Rio de ônibus para deixar minha fita com um diretor da Sportv".

Fez algumas narrações de gol na TV Gazeta e nada. Foi então que Hebe Camargo ajudou.

Tia Célia, a madrinha, ouviu a Hebe dizer que o SBT estava montando uma equipe de esportes. Paulo ligou no dia seguinte e ninguém sabia de nada. Mandaram ligar uma semana depois. E depois, e depois. Mais uma vez. Foram oito ligações em um mês, sempre pedindo o departamento de esportes. A resposta era a mesma, com variações "não existe esse departamento, não conheço etc".

Um dia, a telefonista disse: "um momento, vou passar". Paulo Andrade nem acreditou. Mas foi em frente. Conseguiu a entrevista. E, dez dias, depois, a vaga.

Seria o narrador da casa, ao lado de Dirceu Maravilha. Houve ainda um teste. Chegou ao estúdio para narrar um tempo de um jogo da Holanda. Na sala, muitos executivos. Vestidos como executivos, o que assusta quem busca emprego. Paulo perguntou quem era aquela gente e soube que metade deles carregava o sobrenome Abravanel.

"Então, eu percebi que tinha três opções: saía correndo de medo, fazia uma transmissão de merda ou faria algo bom e mostraria que ali estava o narrador que eles queriam. Foi o que fiz, cresci na adversidade e consegui a vaga".

Era 2004. Durou quatro meses, a equipe do SBT. Ficaram os elogios e a certeza de que a carreira iria deslanchar. Só faltava o convite para um novo trabalho. Convite que não veio.

Era hora de desistir do sonho. Sem emprego e prestes a casar, Paulo Andrade resolveu procurar emprego fixo, como publicitário. Chorando, comunicou a decisão à mãe, Selma.
Ela insistiu muito para que não desistisse. Por fim, conseguiu que ele continuasse na TV comunitária, uma vez por semana, sem ganhar nada, para não ficar longe da narração.

Paulo aceitou e quatro meses depois, antes de entrar no estúdio, recebeu um telefonema de um amigo. Ele disse que tinha informação que José Trajano iria ligar. E ligou. Perguntou se Paulo poderia ir terça, quarta ou quinta na ESPN conversar. A resposta foi rapidíssima. "Amanhã, estou aí".

Trajano disse que precisava de alguém, mas que gostaria do Paulo Andrade do início do SBT e não do final do SBT. Em quatro meses, ele havia sido muito pressionado para gritar bastante nas transmissões. Grito significaria audiência, o que não se confirmou.

"Percebi que o Trajano havia estudado meu trabalho. Fiquei feliz, fiz o que ele queria e estou aqui há 11 anos".

No ano passado, fez a transmissão mais triste da vida. Os 7 a 1 da Alemanha contra o Brasil. Gritou todos os gols alemães. "Talvez houvesse um, só um, torcedor alemão vendo o jogo. Esse cara merecia meu profissionalismo. E teve".

E vai continuar assim, seja o campeonato que for. "Outro dia, escrevi no Twitter que estava em Campina Grande para Campinense x Grêmio e os leitores começaram a me consolar, uns, e a ironizar, outros. Falavam que eu já estive no Bernabéu e agora estava em Campina Grande. Para o meu trabalho, não muda. Repito o mesmo processo sempre. Busco informação e trabalho sério".

Desde então, acabou virando a voz do canal na Liga dos Campeões.

E o principal torneio de clubes da Europa perderá um telespectador fiel na próxima temporada. Pelo menos na fase de grupos, explica Paulo Andrade, que narrou todas as finais da competição de 2008 até 2015 (no próximo dia 6 de junho).

"Não vou conseguir ver. Estou ainda assimilando essa separação. Utilizando uma comparação de mau gosto, é como se eu tivesse perdido um parente querido e ainda não tivesse aceitado", diz o narrador da ESPN, que perdeu os direitos de transmissão para o Esporte Interativo a partir da temporada 2015/2016.

De certa forma, a Liga dos Campeões é a cara da ESPN. E Paulo Andrade ficou marcado como a voz da Liga. Ele concorda com a análise, mas diz que não ficará preso ao passado.
"Não vou ser viúva da Liga. A vida continua e vou fazer outros eventos na ESPN", diz.

O Inglês, por exemplo. "Eu sou um narrador e vivo de eventos. Tudo ficou claro com a direção da casa quando renovei contrato até 2018. Também apresento, mas sou essencialmente um narrador. Se eu for um narrador nota sete, sou um apresentador nota quatro", analisa.

Seja qual for o evento, Paulo Andrade não abrirá, nunca, mão de um desafio e de uma rotina.

A rotina é o trabalho de preparação para o jogo. Ele estuda os times pelo menos três horas e faz todo um resumo de informações.

Nada é impresso. Tudo é escrito em folhas de sulfite, sem linhas, com uma letra minúscula. Depois, os temas sublinhados com caneta marca-texto.

"Se o jogo está ruim, coloco informação para o ouvinte. Todo meu trabalho tem essa mescla de narração e informação", afirma.

O desafio é sempre dizer o nome do autor do gol antes de a bola entrar. Não tem bordão e nem precisa gritar gol. Mas o telespectador precisa saber quem fez.

Por exemplo: "Marcelo cruza, Neymaaaar. Gol do Barcelona". Quando Paulo Andrade grita gol, Neymar já está correndo para comemorar, mas quando gritou Neymaaaar, a bola ainda não havia entrado.

"Este desafio é baseado em José Silvério, o melhor narrador de todos os tempos. Cresci ouvindo Silvério na Pan e ouço agora na Bandeirantes. Ele fala antes e eu também", diz.
Paulo Andrade gosta também de explicar um pouco do jogo nas narrações. Fruto de seu tempo como jogador. "Joguei na base do Corinthians, da Portuguesa e de outros times. Até os 19 anos, quando parei. Fui estudar publicidade", conta o narrador, hoje com 34 anos.

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Reportagem de Luis Augusto Símon

Sobre o Blog

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