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Silvio Luiz diz que foi responsável pelo primeiro palavrão ao vivo da TV

UOL Esporte

26/01/2015 06h00

Silvio Luiz abre a porta, e o funcionário da Rádio Transamérica grita "mito". Justo, ele se dirigia a um dos jornalistas esportivos mais consagrados do Brasil. Homem que assumiu o microfone na adolescência e construiu uma legião de fãs em mais de 60 anos de carreira.

Neste período maior que a vida de muitos brasileiros, Silvio Luiz imortalizou bordões, passou por saias justas e, como grande marca, deixou as transmissões esportivas menos sisudas. O narrador carrega uma aura ao seu redor. A referência existe até por quem nem é brasileiro, como o Google, que colocou sua voz no Waze (aplicativo de trânsito). Confira algumas das histórias colecionadas pelo figuraça Silvio Luiz.

Palavrão pela primeira vez na TV

Silvio Luiz diz que protagonizou o primeiro palavrão da televisão no país. O filho da p… transmitido ao vivo na década de 1950 chocou a família brasileira. Foi durante um São Paulo x Corinthians. "O Luizinho, que é o Pequeno Polegar, foi expulso num jogo do Corinthians e eu, naquele afã de repórter muito metido, falei ´o que houve Luiz´? Ele falou: 'esse filho da p… me expulsou'. Porra, 1953! Filha da p… na televisão era um negócio que foi parar na Câmara de Vereadores, proibida a entrada dos repórteres. Agora que culpa eu tenho se ele falou que o juiz era filho da p…?"

Garoto de recados

No começo da década de 1950, Silvio ganhou um apelido e muita cornetada dos companheiros de profissão. "O Leônidas (da Silva) passou a ser técnico do São Paulo e, naquela época, o técnico não podia ficar no campo, ficava lá fora no alambrado. Eu tinha trabalhando com ele, que queria passar uma instrução pro Poy, que era goleiro do São Paulo. 'Fala pro Poy acionar o Teixeira lá na ponta'. E essa minha transmissão (do recado) foi flagrada por um jornal. Foi uma festa cara." Pombo correio foi um dos apelidos que Silvio Luiz recebeu na sequência. "Se houvesse internet na época ia render meme por uma semana. Deus me livre", exclama o narrador diante desta possibilidade.

Vinho do Galvão

Silvio Luiz conta que é grande amigo de Galvão Bueno, e que em diversas viagens internacionais a trabalho, o global sempre fez questão de pagar jantares. Mas ele lamenta que o contato diminuiu porque Galvão mora longe, e conta que quem lhe dá notícias é Arnaldo Cézar Coelho pelo Facebook. "O Arnaldo mandou um e-mail pra mim: 'o Galvão quer tomar um vinho em fevereiro. Chama uma táxi que você não vai guiando'. Ele fábrica vinho e o vinho dele é bom. Já tomei umas duas ou três vezes e é da melhor qualidade".

MasterChef

Silvio Luiz achou Vasco e ABC pela Série B no ano passado tão chato que leu uma receita de bolo de milho durante a partida. "Já fiz muito tempo atrás e quando o jogo tá chato, pro cara não mudar de canal, você tem que inventar alguma coisa, pô! Vou dar uma receita de bolo de milho. Eu tenho guardada a receita, mas essa Série B que vem ela vai mudar para bolo de fubá." Ele lembra que não foi a primeira vez que usou deste artifício e acrescenta que recebeu muitos e-mails pedindo a receita. Mas admite que alguns torcedores do Vasco reclamaram no Twitter. Silvio Luiz garante que não faltou com o respeito ao clube, apenas reagiu à má qualidade da partida. "E o jogo tava uma merda, se é que você quer saber".

Maçonaria de boleiros

"Eu tinha grandes amizades naquela época. Saía para noite com jogador, saía para jantar com jogador, frequentava a casa, a família do jogador". Silvio Luiz diz que a profissionalização do futebol criou figuras como o empresário e o assessor de imprensa e isso afastou os jornalistas. Ele conta que nos anos de 1940, 1950, 1960 existia uma espécie de irmandade, e a amizade prevalecia. "Apesar de sair com jogador, ver fulano bebendo, nunca falei que vi fulano bebendo. Existia uma espécie de maçonaria". Silvio diz que convivia muito com o elenco do São Paulo e a confraria tinha atletas como Maurinho, Manzolinho, Mauro, Zezinho e Canhoteiro.

Gol fora do vocabulário

Parece um descalabro, mas um dos grandes narradores da crônica esportiva brasileira afirma que jamais gritou gol. "Eu não me vejo no momento (do gol) de chamar o cara que tá em casa de burro. Eu acho que sou um legendador de imagem". Ele procura acrescentar informações ao lance como quem fez o gol e o tempo de jogo, porque a imagem é auto-explicativa. "Não preciso gritar gol se o som ambiente grita o gol. Eu boto uma legenda naquilo. Se eu estivesse no rádio, seria diferente".

Irreverência ao microfone

A televisão era uma coisa sisuda até Silvio Luiz. Ao repetir a formalidade do teatro, tudo ficava muito quadrado. O narrador apostou na irreverência, em usar termos do cotidiano para aproximar o futebol do telespectador. A opção explica termos como pagode na cozinha, desandar a maionese e tantos outros. "Tira o smoking do futebol que era antigamente. Vamos fazer de manga de camisa, vamos falar do cotidiano, misturar o futebol com a vida da dona de casa, do pai de família."

Ator mirim

A mãe de Silvio Luiz era locutora de rádio e, na década de 1940, levava o filho para o estúdio. Espoleta, o garoto, então com 12 anos, vivia pedindo para falar ao microfone e um dia recebeu a boa nova: ia estrear numa rádio novela. Mesmo com o papel na mão, decorou o texto, coisa que não precisava de muito esforço. Tinha apenas uma fala: 'uma carta para o senhor'.

"Chegou na hora, o cara baixou o braço, contrarregra bateu a porta. O cara abriu e falei 'uma carta para o senhor'. Depois, continuei a fazer pontinha aqui, pontinha ali, e a minha mãe foi trabalhar na TV Paulista. Eu fui junto e ali fui convidado a ser repórter. Caiu a sopa no mel, deram milho pra bode". Silvio não sabe a data exata, mas acredita que devia ter entre 15 e 16 anos e ressalta que assinou a Carteira de Menor, Carteira de Trabalho da época para quem não atingira a maioridade.

Mininarrador

Na infância, Silvio Luiz era apaixonado por jogar botão. Na década de 1940, a brincadeira era mais complicada porque não havia jogos de times para vender. Para montar as equipes, o menino pegava botões da mãe e fazia uma traquinagem no colégio. "Quando eu precisava de um botão diferente, no inverno o pessoal ia para escola e pendurava os capotes. Eu esperava a turma ir pro recreio e, com uma gilete, cortava o botão que achava bonito. Um zagueiro, ponta direita e formava meu time."

O narrador organizava tabelas e promovia campeonatos com os 12 times que possuía. "Tinha o campeonato da tampinha também. Antartica contra Brahma, contra os refrigantes da época, Seven Up." Silvio Luiz recorda que também irradiava os jogos enquanto se divertia com o primo e afirma que fazia tudo isso porque estava no sangue o gosto pelo esporte e pelo microfone.

Voz multimídia

A narração inconfundível de Silvio Luiz não está somente na televisão. Há cinco anos, ele empresta a voz para o jogo de videogame PES (Pro Evolution Soccer) e, desde 2013, também orienta motoristas pelo aplicativo de trânsito Waze. "Achei bacana aquilo lá. Aí que eu pergunto: quantos narradores botaram a voz no Waze? Quantos trabalharam para o Google?"

Silvio Luiz conta que esta parceria foi moleza: gravou algumas algumas frases e matou tudo em seis horas de trabalho. O PES foi mais complicado, demorou um mês porque precisou do licenciamento de 500 jogadores e 200 clubes. Mas no final, o cheque caiu na conta e o narrador ressalta que foi pagamento em euro.

Nobre deputado

O narrador não se aprofundou no tema, mas revelou que certa vez foi convidado para virar político. Ele desconversa e diz não se recordar a data nem o partido, apenas sugere que foi um pouco depois das primeiras eleições para presidente da República em 1989. "Eu falei para minha mulher: "eu fui convidado a ser político. Ela falou: se aceitar em uma semana você é ladrão e eu sou puta". Silvio Luiz concorda com a avaliação e rejeitou o pedido para que concorresse a deputado estadual no Estado de São Paulo.

Na ativa

Com um currículo tão longo, hoje Silvio Luiz transmite jogos da Série B pela RedeTV. E o fato de estar fora dos jogos de elite não o incomoda. "Eu tenho que botar na cabeça: eu tenho 80 anos de idade, pô!. Estou mais pra lá do que pra cá. Alguém tem que ficar por aqui, pô. Escanteado por quê? Estou numa empresa que me paga em dia, faço meu arroz com feijão ali."

Sobre o Blog

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