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Narrador do SporTV nem queria voltar para jogo da morte de Serginho

UOL Esporte

22/10/2014 06h00

Serginho_1 "Tem um jogador do São Caetano caído ali e parece até desacordado, Ceretto".  A frase proferida aos 14min do segundo tempo pelo narrador Deva Pascovicci para o repórter, ao vivo no SporTV, era apenas o começo de uma noite longa, inesquecível e sem um final feliz. Foi o hoje cronista da rádio CBN quem narrava o jogo no Morumbi entre São Paulo e São Caetano que culminaria na morte do zagueiro Serginho em função de uma parada cardiorrespiratória, há dez anos.

"Olha o drama que estamos vivendo aqui no Morumbi", falou segundos depois, quando as câmeras já flagravam a ação desesperada dos médicos na tentativa de salvar o defensor do time do ABC. Teve até respiração boca a boca no gramado naquele 27 de outubro. "Saí do estádio já com a sensação de que não tinha como reverter, saí muito mal. Eu morava em São Roque naquela época e foi difícil chegar em casa. Não dormi à noite, passei a madrugada toda acordado. Geralmente a gente chega dos jogos ainda com adrenalina, mas aquele dia fui dormir 7h da manhã pelas cenas que vi e fiquei preocupado", falou Deva, em entrevista ao UOL Esporte. (Ouça abaixo o momento da queda de Serginho).

Apesar de não ter dado ao vivo a notícia da morte do defensor, o narrador relata que a experiência foi a mais difícil de sua vida profissional. Não só, obviamente, por ver as cenas de uma pessoa com a vida em jogo. Mas a de ter que conduzir ao vivo uma situação completamente inesperada e que exigia muita responsabilidade nas informações. "Essa é a maior preocupação.

"O Ceretto (repórter) e José Maria de Aquino (comentarista), jornalistas experientes, souberam conduzir com a gente. Passou até uma tranquilidade. Mas não tem nada parecido com isso (na carreira). A sensação é de que aquilo não acabava nunca. Desde o momento que ele passou mal até encerrarmos a transmissão, a sensação foi de que ficamos no ar umas três horas. Mas foram 15 ou 20 minutos", relatou. "À medida que o tempo passou, vimos que era grave e que ele não tinha reação. Não tínhamos noção de tempo, ficávamos desesperados para ver o socorro  chegar, e parecia uma eternidade. Depois vimos que o tempo de chegada não foi longo. A sensação que tivemos na hora era de algo muito grave e irreversível. Tínhamos a informação de ser grave, tanto que o Ceretto saiu dali pro hospital", prosseguiu.

O dia ruim ainda continuaria uma semana depois. O narrador conta que a direção do canal decidiu que a mesma equipe que foi escalada para a trágica partida teria que continuar a transmissão dos 31 minutos restantes na partida remarcada para o dia 3 de novembro, vencida pelo São Paulo por 4 a 2. Deva conta que não gostaria de ter participado daquele jogo e diz que foi a situação foi pior do que no dia que culminou na morte de Serginho.

"No momento do primeiro jogo tivemos sensação de missão cumprida, mas voltar pro Morumbi e fazer a sequência do jogo foi muito pior do que contar a história. Começamos a contar uma história que era uma morte e tínhamos que continuar", lembrou. "A equipe inteira chegou mal para fazer aquela partida. A direção entendeu que fizemos um trabalho correto naquele dia e que tínhamos que continuar. O mais correto deveria ser outra equipe, estava todo mundo muito abalado. Tínhamos que relatar tudo aquilo, mas sem o Serginho lá. Naquele dia foi tudo diferente. Nem deveria ter tido sequência aquele jogo, nem transmissão, nada", recordou. A sensação descrita por Deva para o segundo jogo pode ser sentida ao ouvir os seis gols nos 31 minutos do segundo jogo. O narrador demonstra pouca emoção para narrar os gols marcados. Ouça a narração abaixo.

José Ricardo Leite

Do UOL, em São Paulo

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