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Da seleção de vôlei para a novela das 21h: a trajetória de Lica Oliveira

UOL Esporte

03/04/2014 06h00

Se você perguntasse a Eliani de Oliveira aos 20 anos o que ela imaginava que estaria fazendo hoje, aos 44, certamente não teria como resposta: "vou ser uma atriz na novela das 21h da Globo". Naquela época, ela estava em outro mundo, o do esporte. Atualmente ela é conhecida por Lica Oliveira e vive a personagem Dulce no folhetim "Em Família", engatando mais uma carreira em uma vida em que já foi jogadora de vôlei olímpica, jornalista, apresentadora e agora atriz.

Lica, de 1,77 m, seria uma baixinha nas quadras hoje se quisesse voltar a jogar de central para encarar outras colegas de posição. Mas, numa época em que o vôlei evoluía de sua fase amadora para a profissional que se vê hoje, a carioca se deu muito bem. Conviveu com estrelas como Ana Moser, Fernanda Venturini e Fofão, jogou duas Olimpíadas e até atuou e morou na Itália, ainda sem fazer ideia de que sua vida lhe reservaria outras tantas voltas.

Lica - Globo/João Miguel Jr. - Globo/João Miguel Jr.
Hoje, Lica Oliveira deixou para trás o vôlei e o jornalismo e vive a personagem Dulce na novela "Em Família"
Imagem: Globo/João Miguel Jr.
Foi com oportunidades certas, uma boa dose de estudos, trabalho e treinos e uma ajuda da sorte que Lica conseguiu uma trajetória às vezes improvável, tendo de recomeçar sua vida quando escolheu fazer jornalismo, depois do vôlei, e o mesmo acontecendo para poder virar atriz.

"Eu sou muito grata pelas oportunidades. No vôlei eu vivi tudo que podia como jogadora. Fui a duas Olimpíadas, morei fora, onde tive meu filho, e fechei um ciclo muito interessante. O jornalismo é algo que estava muito a fim de fazer, e cheguei na televisão, assim como queria. E a teledramaturgia – que eu achava que nem teria mais chance de fazer com minha idade -, foi uma benção e estou muito feliz de viver isso", conta ela.

O começo: vôlei

Lica Oliveira nasceu no Rio de Janeiro e tentou um pouco de tudo. Chegou a se testar no atletismo, mas não competiu. Achava que não tinha porte físico para isso, mas seu tamanho acabou gerando um interesse em tentar o vôlei, ainda no colégio. O momento chave foi num torneio interno, em que ela fazia parte do time da 6ª série e se sagrou campeã sobre meninas da 8ª, inflando o ego de todas as garotas. "A turma toda saiu atrás de treinar", relembra.

Sócia de um clube, ela acabou sendo encorajada por uma amiga e também foi atrás. Aos 12 anos, já "meio altinha" para a média de suas amigas, bateu uma bola e chamou a atenção da técnica. Rapidamente foi federada e colocada para jogar um campeonato mirim. Em 1977, começava sua vida como atleta.

Três anos depois, ainda conhecida como Eliani, a carioca já estava na seleção de novos, aos 16, e quatro anos depois, recebeu a convocação para os Jogos de Los Angeles, em 1984.

"Peguei a década de 1980 toda na seleção. Com Olimpíadas, Mundiais, Pans. Eu peguei a fase de transição do vôlei. Quando comecei era o 'paitrocínio'. Apesar de ser funcionário público, meu pai teve de bancar treinos, tênis, joelheiras… Naquela época era complicado de transmitir jogos, era o tempo da vantagem, então a partida durava três, quatro horas. Hoje evoluiu, facilitou para ser mais atrativo. Peguei um pouco da fase precária, mas não foram vacas tão magras, também tive um pouco de conforto e deu para juntar um dinheirinho – apesar de saber que a carreira era curta e uma hora ele ia acabar", contou Lica.

Ela até tentou investir em outras coisas. Começou faculdades de comércio exterior e fonoaudiologia, mas não conseguia conciliar as coisas. Acabou provando ser a melhor coisa.

Lica lista conquistas de título brasileiro (foram quatro) e as com a seleção como as mais especiais da carreira. E na lembrança ficam as festas após os títulos, algumas até engraçadas. "Certa vez, conseguimos a classificação para a Olimpíada de Seul. Na comemoração, algumas exageraram. Tínhamos que sair às 7h da manhã, rumo ao aeroporto e a comemoração foi madrugada adentro. De manhã, a gente estava tentando disfarçar para a comissão técnica, uma segurando no braço da outra. Entramos no ônibus arrumamos tudo. Mas a menina que estava pior não aguentou e vomitou. Estragou tudo! Mas é assim, uma farra. Nessa hora todo mundo vira criança", ri Lica, com as lembranças.

A trajetória foi longa, e a levou a morar na Itália com o ex-marido (com quem tem um filho). A carreira nas quadras só se encerrou em 1998, quando satisfeita e realizada com o que tinha vivido, Lica resolveu encerrar aquele capítulo.

Estagiária no jornalismo

É difícil recomeçar passados os 30 anos, mas Lica Oliveira gosta de desafios. Ela encarou um curso de jornalismo e não teve vida fácil para começar na profissão. Chegou a ser estagiária, mas logo conseguiu se estabelecer e perseguir o sonho de atuar na TV.

A carioca esteve em dois jornais da RedeTV! – enfrentou até um tiroteio em uma cobertura por lá – e seu ápice foi quando entrou para o Esporte Espetacular, da Globo.

"Gostava da linguagem televisiva, sabia que eu queria esse ambiente. E surgiu a oportunidade de fazer um teste para o Esporte Espetacular porque a Glenda (Kozlowski) estava grávida e ia tirar um período de licença maternidade. Fui aprovada e foi interessante, eu queria muito fazer esporte, que era o que conheci a minha vida inteira". Apesar de ser um programa leve em seu formato, a coisa não foi tão fácil para ela. "Hoje talvez me sentisse mais segura… Naquela época foi pesado, porque não tinha tanta experiência."

A atriz global

Foi junto ao jornalismo que nasceu a carreira de Lica como atriz, na segunda metade dos anos 1990. Enquanto cursava a faculdade, ela visitou a Rede Globo para fazer uma matéria. E acabou confundida. Uma produtora de elenco achou que ela estava lá por conta de testes e, por precisar de alguém com seu tipo físico, a abordou. Ela acabou aprovada para fazer a Oficina de Atores e, mesmo sem uma formação em dramaturgia, passou a conciliar mais uma paixão.

Lica participou de "Viver a Vida", de Manoel Carlos, e também trabalhou com o autor em "Mulheres Apaixonadas", de 2002. Outro trabalho do que se orgulha foi sua primeira participação nas telonas, no filme "Faroeste Caboclo".

Na novela "Em Família", a personagem Dulce faz parte de um dos núcleos principais da trama, permitindo a Lica contracenar com atores como Bruna Marquezine, Julia Lemmertz e Humberto Martins.

As carreiras mudaram, mas cada fase da vida de Lica acabou deixando lições. "O vôlei me ensinou muito. É o tipo de modalidade em que você não pode errar nunca e em que você tem de saber trabalhar em equipe, depende de suas companheiras. Esse perde e ganha do vôlei é também a vida, você tem de se superar a cada dia". E é assim que a jornada improvável de Lica segue, sempre aguardando por novos desafios.

Maurício Dehò
Do UOL, em São Paulo

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