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Álvaro José revela narração mais difícil: "judô às cegas"

UOL Esporte

13/11/2013 06h00

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Crédito da imagem: Edu Moraes/Record/Divulgação

Narrar uma final olímpica com transmissão para todo o Brasil. Mas isso sem ao menos poder assistir ao evento, seja in loco ou numa transmissão. O desafio, que parece impossível para a maioria, foi vencido com êxito por Álvaro José. Em 1992, durante a Olimpíada de Barcelona, na Espanha, o narrador conseguiu superar as dificuldades técnicas e realizou a locução de dois combates do judoca brasileiro Rogério Sampaio no torneio sem ver nenhuma imagem da disputa.

A situação inusitada aconteceu no estádio Olímpico de Montjuic (hoje Lluís Companys) durante a transmissão dos Jogos Olímpicos pela TV Bandeirantes. Logo na primeira luta do brasileiro, que conquistou o ouro na competição, Álvaro José teve que "se virar" quando descobriu que o duelo seria realizado no tatame B e ele só teria imagens do tatame A. "No escuro", o jornalista teve que contar com a ajuda do então editor Rogério Carneireiro para realizar o trabalho.

"Eu estava no estádio Olímpico de Montjuic. Naquela época tínhamos todos os sinais na posição de comentarista, o que não acontece hoje. A primeira luta do Rogério foi contra o português Augusto Almeida, luta no tatame B e eu só tinha sinal do tatame A. Aí fechei os olhos, colocaram no meu ouvido o retorno do nosso editor Rogerio Carneireiro, que foi árbitro de judô. Ele que falava: "Eles estão em pé. Agora no solo". Imaginei a luta e com a ajuda dele fui falando. Quando a luta acabou, duvidaram que eu não tinha o sinal. Nelson Guzzardi, diretor da transmissão, abaixou o comunicador e todos bateram palmas", conta em entrevista ao UOL Esporte.

A emoção não parou por aí. Ainda sem sinal do tatame B, Álvaro José teve que repetir a dose de percepção para o segundo combate do brasileiro, que foi contra o sul-coreano Sang-Moon Kim. E mais uma vez a tática funcionou.

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"Fizemos o mesmo na segunda luta contra o sul-coreano Sang Moon. Aí, mal acabou o combate, veio ordem do Luciano do Valle para eu abandonar o atletismo e descer o Montjuic para o estúdio da TV. As outras lutas foram feitas de lá, até o ouro contra o húngaro Jozsef Csak", lembra, ainda sem entender direito como tudo deu tão certo.
O episódio, considerado pelo profissional como o "mais bizarro" da carreira, é apenas um dentro da longa história de Álvaro José nas narrações esportivas. Apelidado de "A Voz da Olimpíada" por Luciano do Valle, o jornalista esteve em nove edições dos Jogos e considera Barcelona (1992), Pequim (2008) e Londres (2012) como as mais especiais.
Além do judô, ele lembra com carinho a locução da conquista de Joaquim Cruz, nos 800 m rasos, em Los Angeles 1984, e brinca quase que de forma supersticiosa com sua sorte no dia 6 de agosto.
"Joaquim naqueles 800 m bateu o campeão olímpico Steve Ovett e o recordista mundial Sebastian Coe. Isso foi no dia 6 de agosto de 1984. Douglas Vieira de manhã foi prata no judô e, depois da vitória do Joaquim, fui para a Arena de Long Beach com Luciano do Valle para Brasil 3 x 0 EUA no vôlei masculino, resultado que garantiu a presença nas semifinais da geração da prata. Vitória de um time que jogou muito. No dia 6 de agosto de 2012, transmiti o ouro do Arthur Zanetti, em Londres. 6 de agosto é um dia forte na minha vida olímpica", comenta.
Outro momento marcante na carreira do jornalista foi a narração do ouro olímpico de Cesar Cielo na Olimpíada de Pequim, 2008, quando chegou a "prever" que o nadador brasileiro conseguiria terminar a prova na primeira colocação por conta do desempenho demonstrado no Pan do Rio, em 2007.
"Foi muito bacana a vitória do Cielo, a única medalha de ouro masculina dos Jogos de Pequim. No Pan do Rio, quando ele fez 21s84, praticamente sem adversários, percebi que ele seria pódio em Pequim, um ano depois. Inclusive, falei que ele poderia ser ouro nessa transmissão. "Um tempo que pode lhe dar a medalha de ouro olímpica", afirma.

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Passado na NBA e novo desafio na Record

 

Com vasta experiência no jornalismo, Álvaro José ficou caracterizado como um narrador completo e com habilidade para trabalhar em diversas modalidades. Uma demonstração dessa versatilidade foi durante o tempo em que transmitiu a NBA para o Brasil.

 

Fã de basquete, o jornalista define como um privilégio a oportunidade de narrar pela Band a final da temporada 1998/99, uma das últimas na TV aberta, entre Chicago Bulls e Utah Jazz, quando Michael Jordan se despediu do time de Illinois com uma atuação de gala e garantiu o título para a franquia.

 

"Foi empolgante. Um dos maiores momentos da minha vida. O pico da audiência passou dos dez pontos. Jordan foi um dos maiores atletas do século 20, só comparado a Pelé e Muhammad Ali. Naquele jogo, o Chicago venceu por um ponto, 87 a 86, e Jordan marcou mais da metade. Ele fez 45 pontos. A transmissão foi lá no Delta Center e eu me sentia bem, estava ligado. Foi um dos grandes momentos da minha vida profissional, mas só descobri isso depois, quando ele deixou os Bulls e repetiram várias vezes os melhores momentos daquele jogo. Estive nos seis títulos do Chicago Bulls, mas só narrei contra o Portland e as duas contra o Utah Jazz. Diante do Los Angeles Lakers, Phoenix Suns e Seattle Supersonics, Luciano do Valle que narrou com muita emoção. O jogo de 98 foi no inicio da Copa da França e eu assisti Brasil x Escócia lá nos Estados Unidos", afirma.

 

No entanto, o passar dos anos fez Álvaro José perder um pouco do encanto pela NBA. Com o torneio, segundo ele, carente das estrelas que marcaram os anos 90, o narrador afirma não sentir saudade de trabalhar com a liga e acredita que a televisão aberta não conseguiria repetir os índices de audiência da "Era Jordan" caso investisse na transmissão do campeonato, principalmente por conta do crescimento da TV a cabo.

 

"Hoje vivemos outro momento. Esporte é muito forte nos principais canais a cabo. Quando fizemos a NBA tinham poucos canais transmitindo para outros lugares do mundo. Em 1998, eram dezenas de canais a cabo de todo o planeta e poucos canais abertos. Quinze anos depois a diferença é mais acentuada. Não vejo a NBA como no século passado. Não tenho saudade de narrar não", analisa.

 

Mesmo sem o mesmo interesse de antigamente, o jornalista fez questão de comparecer ao jogo entre Chicago Bulls e Washington Wizards, que ocorreu em outubro no Rio de Janeiro e marcou a primeira partida da NBA no Brasil, mas deixou a Arena HSBC com uma ponta de decepção ao ver que não houve nenhum tipo de homenagem a Luciano do Valle, que, segundo o narrador, foi responsável pelo crescimento da liga no país.

 

"Fui à Arena da Barra, que fica próxima a casa da minha filha (a atriz global Fernanda Paes Leme) e cheguei com o jogo já iniciado. Mas foi bacana ver a NBA no Brasil. Poucos sabem, mas a NBA se tornou um fenômeno aqui por causa do Luciano do Valle, que chamava os jogos de basquete nas transmissões de futebol e falava de Magic Johnson e do "nosso Lakers". Os organizadores do evento no Rio e a própria NBA deveriam ter prestado uma homenagem ao Luciano. Foi uma falha", dispara.

 

Mesmo com notável história no jornalismo esportivo e uma série de sonhos realizados na profissão, Álvaro José parece ainda estar longe de parar e mais histórias marcantes devem estar por vir. Aos 55 anos, ele vive seu segundo ciclo na Record e acaba de estrear um novo quadro no programa "Esporte Fantástico". A atração, batizada como "Arquivo Fantástico", consiste em relembrar imagens que a emissora captou ao longo da história.

 

"O Arquivo Fantástico veio preencher uma lacuna na TV brasileira. Temos material para uns dois anos de programas inéditos e o editor Léo Romano gosta de garimpar essas raridades. Mostramos na estreia o primeiro jogo de Garrincha e Pelé na seleção brasileira. Pacaembu 1958 contra a Bulgária. Curiosamente esse foi o último jogo dos dois, na Copa 66, única vitória brasileira no mundial da Inglaterra. Vem muito mais por aí", promete.

 

Patrick Mesquita,

Do UOL, em São Paulo

 

Clique e veja algumas das narrações e Álvaro José:

 

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